A manutenção de um diálogo constante, transparente e produtivo entre a gestão de uma instituição pública e a entidade representativa dos trabalhadores é essencial para garantir que as demandas da categoria sejam devidamente ouvidas e respeitadas. Esse canal de comunicação, além de facilitar negociações, deve assegurar que a atuação sindical permaneça livre e autônoma, permitindo a mobilização necessária quando os interesses dos servidores não forem atendidos.
Essa perspectiva, porém, não tem sido alcançada no Ministério Público de Sergipe (MPSE) nos últimos quatro anos. O período, que coincide com a gestão de Manoel Cabral Machado Neto no cargo de Procurador-Geral de Justiça (PGJ), foi marcado por diversas ocasiões em que a gestão do órgão deixou de ouvir as reivindicações do Sindicato e da categoria de forma célere e transparente.
A falta de diálogo e de avanços concretos nas negociações gerou, ao longo desses anos, diversos episódios de confronto entre a categoria e a gestão. Entre as primeiras crises, esteve a recusa do PGJ em aceitar a suspensão do trabalho presencial e retorno ao isolamento em nova alta de casos de COVID-19 durante a pandemia, contrariando o pleito dos servidores que buscavam medidas de segurança sanitária, conforme denunciado pelo Sindicato.
Nesse contexto, a categoria seguiu reivindicando um compromisso efetivo com pautas fundamentais, como a equiparação de benefícios e a revisão salarial, enquanto a administração mantinha-se irredutível. Foi nesse período que PGJ se empenhou pela aprovação da Gratificação de Acervo, um adicional aos já elevados salários de promotores e procuradores que motivou protestos dos Servidores.
Em 2021, apesar de tentativas iniciais de diálogo, a gestão de Machado insistiu em travar avanços, alegando contingenciamento orçamentário. A pauta pela revisão inflacionária, um direito constitucional dos trabalhadores, foi reiteradamente negada, enquanto o PGJ promovia o aumento de benefícios para membros da instituição.
A falta de transparência nas discussões, com promessas de estudo das reivindicações sem uma resposta concreta, ampliou o descontentamento. Além disso, a abertura de vagas para estagiários pós-graduandos, sem a realização de concurso público, foi vista pelo Sindicato como uma tentativa de desvalorizar ainda mais os servidores efetivos, intensificando as críticas à administração.
O ano de 2022 trouxe à tona outras questões polêmicas, como o tratamento desigual entre membros e servidores. Enquanto promotores e procuradores recebiam aumentos significativos em auxílios e indenizações, os trabalhadores efetivos viam suas pautas travadas. Mesmo com melhorias orçamentárias, a recomposição salarial não avançou.
Em resposta, o SINDSEMP-SE intensificou as denúncias de injustiça na política salarial, enviando uma Carta Aberta aos Procuradores de Justiça e organizando manifestações para pressionar por respostas. A insatisfação da categoria aumentou à medida que a administração do MPSE aprovava mais cargos comissionados e travava propostas de reajuste para os servidores, o que culminou em uma série de protestos e moções públicas por parte do Sindicato.
Em 2023, os episódios de atrito com a gestão se tornaram ainda mais evidentes. Após a promessa de um reajuste de 6% no salário e nos auxílios para os trabalhadores efetivos, o SINDSEMP-SE enfrentou novas dificuldades, como o cancelamento repentino de reuniões com o PGJ, rompimento do diálogo por duas vezes e a recusa da administração em priorizar a realização de concursos públicos.
A situação foi agravada pela divulgação de uma enquete entre membros para criação de mais Cargos em Comissão (CCs), o que gerou novas críticas do Sindicato, que denunciou a falta de isonomia e a reforma do quadro de pessoal. Ao final do ano, o SINDSEMP “comemorou” o amargo aniversário de seis anos sem uma convocação sequer de servidor público concursado no MPSE.
A gestão Machado se encerra com 54 novos cargos e funções criados. Em junho daquele ano, pela primeira vez surge a informação que o PGJ pretendia encaminhar projeto modificando o auxílio-saúde do MPSE, o que permitiria pagar valores muito maiores aos membros. Além disso, a administração do MPSE se empenhou para inserir uma nova indenização fora do teto constitucional, enquanto adiava indefinidamente o reajuste do auxílio-saúde para os servidores.
Por fim, em 2024, a insatisfação dos servidores atingiu seu ápice. Completando um ano e dois meses sem negociar diretamente com a categoria, Machado manteve travadas pautas importantes, como a revisão inflacionária e a convocação de novos servidores via concurso público, que não é realizado há mais de dez anos. A falta de ações efetivas de combate ao assédio moral e o aumento significativo de Procedimentos Administrativos Disciplinares (PADs) sem fundamentação contra servidores ao longo desses quatro anos de sua gestão, acentuaram ainda mais a percepção de desvalorização.
Mesmo após algumas vitórias isoladas, como o reajuste mínimo de R$ 200 na Gratificação de Especial Operacional (GEO) por cumulação e o Auxílio-Educação Infantil apenas para os servidores que possuem filhos pequenos, a sensação de descaso prevaleceu, especialmente após o PGJ pautar e aprovar no CPJ o aumento do auxílio-saúde para promotores e procuradores, excluindo os servidores, reforçando ainda mais a tônica de sua gestão de tratamento desigual
“Sem dúvidas, foi uma das piores gestões, senão a pior para os servidores. Machado chegou com grande expectativa da categoria, que acreditava que poderia fazer diferente e valorizar nossa carreira, mas com o tempo foi se mostrando mais do mesmo. Foi uma gestão que focou principalmente em promover ganhos remuneratórios aos já altos salários de promotores e procuradores, enquanto o órgão ficava 10 anos sem concurso, cada vez com menos servidores e os que ficam estão desestimulados com a ausência de valorização. Até cobertura de estacionamento para o público a gestão de Machado deixou de fazer, pra se ter uma ideia”, avalia Roque Sousa, coordenador de Relações Institucionais e Comunicação do SINDSEMP.
Foram muitas as as mensagens concretas e simbólicas que o PGJ deu de que os servidores não estavam entre suas prioridades. Prova disso é que, no mesmo período em que celebrou os 20 anos da primeira turma de promotores concursados da casa, houve silêncio institucional total dos 15 anos dos primeiros servidores concursados. São quatro anos sem publicar um edital de concurso sequer – período em que a perda de servidores da instituição chega a uma média de sete por ano.
Infelizmente, o gestor deixa o cargo entrando para a memória dos servidores como um PGJ que nada fez pelos servidores além de conceder migalhas enquanto dispensava uma grande parcela do orçamento da instituição para promotores e procuradores. De seus colegas, Machado deverá receber a reverência de uma ótima gestão. Para os servidores, entretanto, restou a sensação de desrespeito. Nós, os Trabalhadores Efetivos do MPSE, bem como o povo sergipano, não nos esqueceremos desse gosto amargo da desigualdade.