A matéria a seguir é de autoria da Assessoria de Comunicação da secção sergipana da Central Única dos Trabalhadores (CUT-SE) e foi originalmente publicado em 12 de fevereiro de 2022. Republicamos aqui, na íntegra, por entendermos que nossa categoria integra a luta da Classe Trabalhadora por mais direitos e respeito em oposição à exploração e ao retrocesso.
Ato denuncia exploração análoga à escravidão nos canaviais de Sergipe
Em frente à Associação dos Plantadores de Cana, no Centro de Aracaju, a manifestação reuniu trabalhadores do campo e da cidade
Escrito por: Iracema Corso
A exploração do trabalho em condições análogas à escravidão foi alvo de manifestação na manhã deste sábado, dia 12 de fevereiro, no Centro de Aracaju. Em frente à Associação dos Plantadores de Cana, localizada na Rua de Capela, movimentos sociais do campo, com apoio da classe trabalhadora e do movimento agroecológico protestaram contra a Usina Pinheiros pela denúncia de 11 trabalhadores trazidos do Piauí e do Maranhão, mantidos em situação análoga ao trabalho escravo.
O site Expressão Sergipana já havia divulgado a ação civil pública contra a empresa VF Mecanização, Transporte e Serviços LTDA e a Usina São José de Pinheiro LTDA ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho no dia 31 de janeiro. A empresa que declara ter capital de R$ 165 milhões possui sócios da família Franco.
A ação do Ministério Público do Trabalho destacou as condições de trabalho precárias, o transporte ilegal dos 11 trabalhadores trazidos do Maranhão e do Piauí, sujeitos a alojamento sem limpeza e estrutura adequada, além do corte da cana próximo ao fogo ameaçando a saúde e a segurança dos trabalhadores.
Trabalhadores agrícolas da região Sul, do Sertão, da região e Centro-Sul de Sergipe e da região Metropolitana de Aracaju participaram da manifestação. Membro do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Mauro Luís explicou que a realidade nas plantações de cana é muito dura.
“O trabalho na cana é uma escravidão permanente, isso é histórico, os trabalhadores nunca se libertaram, é um trabalho muito duro. Na região do baixo São Francisco, em Neópolis, a plantação de cana acontece com pulverização aérea de veneno em cima das comunidades de trabalhadores rurais. As pessoas saem a trabalhar às 5h da manhã e só voltam às 6h da noite. Muitas vezes só tem comida estragada pra comer e recebiam até pouco tempo R$ 36 de diária. A exploração análoga à escravidão existe muito nos canaviais”, criticou Mauro Luís.
O pequeno agricultor destacou que muito político, em defesa do agronegócio, finge não saber a situação que muitos agricultores sofrem. “O agronegócio é colocado como a salvação da agricultura, mas olha o resultado. Ele produz a exploração extrema como na escravidão, produz a monocultura. A cana não é alimento. A cana produz álcool, comodities, não contribui para a alimentação da população. A lei tem que ser cumprida. Se é trabalho análogo ao escravo, as terras têm que ser desapropriadas”, cobrou Mauro Luís.
Felipe Caetano do MCP (Movimento Camponês Popular) criticou que em pleno ano de 2022 ainda exista este tipo de exploração ‘debaixo de nossa vista’. “É revoltante a permanência do trabalho análogo ao escravo, mantendo o trabalhador em condições sub-humanas para garantir o lucro dos patrões no negócio da cana. Viemos denunciar porque esse absurdo foi muito pouco mostrado nos meios de comunicação. A lei precisa ser cumprida e os responsáveis penalizados”, afirmou.
Dalva da Graça do MOTU (Movimento dos Trabalhadores Desempregados/Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos) alertou que este problema não se encerra no campo. “Muitas pessoas que vivem nas periferias e em outras cidades também são levadas para localidades de difícil acesso e enfrentam condições sub-humanas de trabalho. “Diante do desemprego, as pessoas aceitam contrato por comida e moradia. Não podemos aceitar este retrocesso imposto pela direita conservadora do Congresso Nacional. Nossa luta é por direitos, por moradia digna e por emprego digno também”, defendeu.
Dirigentes da Central Única dos Trabalhadores (CUT Sergipe), Joelma Dias e João Fonseca também participaram do protesto. “Enquanto Central Única dos Trabalhadores, estamos aqui apoiando os trabalhadores do campo contra os desmandos nessas usinas que diariamente exploram trabalhadores como escravos. Eles ganham diárias e trabalham sem alimentação adequada, sem repouso, sem água, debaixo de um sol quente. Somos solidários nesta luta e precisamos dar um basta nesses governos que incentivam a exploração desumana dos trabalhadores”.
Fiscalização Sabotada e Impunidade
A impunidade alimenta a continuidade desta prática da exploração do trabalho em condições análogas à escravidão, principalmente após a diminuição da capacidade de fiscalização do Ministério do Trabalho e da Justiça do Trabalho após a Reforma Trabalhista, aprovada em 2017 no governo de Michel Temer, assim como a Medida Provisória 1045/2021 do Governo Bolsonaro.
Como forma de sabotar a fiscalização, em ambos governos golpistas, as equipes de fiscalização e resgate de trabalho escravo foram reduzidas. Além disso, o orçamento disponível é inferior ao orçamento de 10 anos atrás. Se os artigos 184 e 186 da Constituição Federal fossem cumpridos, todos os patrões que constam na Lista Suja do Cadastro de Empregadores teriam suas terras desapropriadas.
Atualmente, as empresas só podem ser multadas após duas visitas “de orientação” de auditores. Por isso é preciso revogar a Reforma Trabalhista, a Medida Provisória 1045/2021 e reestruturar os órgãos de fiscalização para não estimular que a injustiça e a exploração análoga à escravidão se perpetuem em Sergipe e no Brasil.
A manifestação também foi construída por muitos jovens que lembraram a comemoração recente do aniversário de 10 anos do Levante Popular da Juventude. “A juventude sempre teve uma tarefa histórica nas grandes mudanças da sociedade e não podia faltar neste protesto. Os engenhos que se transformaram no agronegócio pela quantidade e posse da terra. Vemos a brutalidade do agronegócio no Brasil e em Sergipe que, aliado a vários políticos desmontaram o Estado brasileiro, os instrumentos de fiscalização e de combate ao trabalho análogo ao escravo”, afirmou Marcos Galvão do Levante.